segunda-feira, outubro 18, 2010

O futuro de uma ilusão - Freud



Freud, Sigmund – O futuro de uma ilusão (1927). São Paulo. Imago, 1996.

Quanto menos um homem conhece a respeito de seu passado e do presente, mais inseguro mostra-se seu juízo sobre o futuro. Com essa sentença Freud inicia seu primeiro capítulo.
Freud define a civilização humana como tudo aquilo que se elevou acima da condição animal. Ele tem a impressão de que a civilização é algo que foi imposto a uma maioria resistente por uma minoria que compreendeu como obter a posse dos meios de poder e coerção. Então afirma que toda civilização tem de se erigir sobre a coerção e renuncia ao instinto. Isto se dá porque todos os homens trazem tendências destrutivas, anti-sociais e anti-culturais.
Só através da influência de indivíduos que passam a fornecer um exemplo e a quem reconheçam líderes, as massas podem ser induzidas a efetuar o trabalho e suportar as renuncias de que a existência depende. Freud aponta que o homem não ama espontaneamente o trabalho e que argumentos não superam as paixões, portanto, somente coercitivamente se tem a civilização.
Toda civilização repousa numa compulsão a trabalhar e numa renuncia ao instinto, provocando oposição dos atingidos por tal exigência. Frustração é o instinto não satisfeito, proibição é o regulamento que estabelece tal frustração, e privação é a condição produzida pela proibição. Há desejos como canibalismo, incesto e ânsia de matar. Instintos reprimidos ou legitimados pela sociedade a seu modo.
Surge o superego como a internalização da coerção externa. De opositor, o homem vira veículo da civilização. Freud aponta o ideal como fonte de satisfação na sociedade. A arte e filosofia são fonte de satisfação substitutiva. Reconcilia o homem com os sacrifícios que tem de fazer em beneficio da civilização.
Inicia seu terceiro capítulo com a pergunta “em que reside o valor peculiar das idéias religiosas?”. Então argumenta que a razão de ser da civilização é nos defender da natureza, das catástrofes e da morte. O homem transforma as forças da natureza em seus iguais, para suportar as catástrofes incontroláveis, pessoaliza a natureza. Transforma-as em deuses. Os deuses tem três missões a seu ver: 1) exorcizar a natureza; 2) compensar o homem pelo sofrimento e privação; 3) a moralidade, onde o homem elege suas próprias leis estendendo à natureza do universo. As idéias religiosas surgiram da mesma necessidade de que surgiram outras realizações da civilização, necessidade de defesa da força esmagadora da natureza. Freud foca então na questão do desamparo humano, visível já na infância, e perpetuado na idade adulta.
Freud credita a razão o fundamento da verificação de qualquer ordem. A religião não a utiliza, ela crê porque é absurdo. A religião vai dizer que os ensinamentos devem ser acreditados porque já eram pelos antepassados; que possuímos provas desses tempos primeiros; e que é proibido questionar a autenticidade. Freud então critica e aponta que a fonte da religião é o desejo, e sua produção é ilusão.
O trabalho cientifico é a única estrada que nos pode levar a um conhecimento da realidade externa a nós mesmos. Ele admite, contudo, a possibilidade de sua forma de pensar, também ser uma ilusão.
Freud reconhece que a retirada de Deus entregaria o homem a seus instintos não-sociais, ao caos, antes banido pelo trabalho. Não seria licito privar as pessoas da religião de onde obtém tanto consolo e não lhes dar nada melhor em troca. Admite que a ciência, nesse sentido, não basta ao homem.
Ele imagina uma reconciliação com a civilização a partir da compreensão do mandamento, não como algo que nos domina, mas que serve a nossos interesses.
Freud define então a religião como a neurose obsessiva universal da humanidade. Surgiu do complexo de Édipo, do relacionamento com o pai. Portanto, com o processo de crescimento e amadurecimento, a religião tende a se afastar inevitavelmente.
Freud propõe uma educação não religiosa. Como tentativa de enriquecer a civilização. Esta teria o propósito de nos levar “um passo a frente”, é uma fuga do infantil para a “vida hostil”, ou uma “educação para a realidade”. Não há conforto, acabou a casa paterna, a vida bate a porta. Propõe o abandono de ilusões para construir uma existência tolerável na terra, e uma civilização não mais opressiva para ninguém.
Se tal intelecto for plantado, objetivará a mesma coisa que os crentes esperam de Deus – o amor do homem e a diminuição do sofrimento. Mas este sem compensação no processo. Para Freud nada a longo tempo resiste à razão e a experiência, logo a religião será posta de lado.
Freud encerra colocando o sucesso da ciência como prova máxima que esta não é uma ilusão.

Ricardo F. Silva
Livre, preso, pleno, em Cristo

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